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quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

O que as escolas vão ensinar sobre dinheiro



O que ensinar a crianças e adolescentes sobre dinheiro? Talvez a tomar boas decisões como consumidores – evitar os excessos e ficar dentro de suas possibilidades. Ou, talvez, a pensar no futuro e poupar para a aposentadoria. Ou, ainda, a entender como funciona a economia do país, o recolhimento e uso dos impostos, a atuação dos bancos, as diferenças entre os serviços financeiros, os comportamentos perigosos ao lidar com finanças, a corrupção, a ética nas transações financeiras, o empreendedorismo, o impacto do consumismo no meio ambiente... a lista pode se estender muito, e todos os assuntos nela incluídos são importantes. Mas os educadores precisarão deixá-la mais concisa se quiserem mesmo que haja algum efeito com a inclusão da educação financeira no currículo escolar. O tema deverá ser adotado no ensino fundamental na rede pública em 2012. Um decreto presidencial (7.397) de 23 de dezembro institui a Estratégia Nacional de Educação Financeira (Enef), que pretende alcançar também adultos. O tema não será abordado numa disciplina, e sim de maneira transversal, em disciplinas já existentes. Mesmo assim, vai consumir recursos e atenção de escolas e professores. “Há uma pressão enorme para incluir no currículo mais disciplinas e mais temas transversais, enquanto o conteúdo tradicional não é dado de forma adequada”, diz Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. O governo precisará organizar os esforços para que “educação financeira” não seja apenas um rótulo vago para um apanhado de assuntos pouco conectados entre si e muito proselitismo antimercado nas escolas.

O texto do decreto anuncia, de modo razoavelmente claro, os objetivos de “promover a educação financeira e previdenciária e contribuir para o fortalecimento da cidadania, a eficiência e solidez do sistema financeiro nacional e a tomada de decisões conscientes por parte dos consumidores”. Com essa definição, e lembrando que temas como meio ambiente já fazem parte da matriz curricular, seria possível definir uma lista coesa de novos tópicos a abordar nas escolas.

O trabalho, porém, não será tão fácil. A iniciativa teve forte participação de entidades do mercado financeiro – bancos, Anbima (que reúne empresas do setor), BM&FBovespa, Banco Central, Superintendência Nacional de Previdência Complementar, Superintendência de Seguros Privados e a Comissão de Valores Mobiliários, que coordenou os trabalhos. Os profissionais dessa área esperam que o conteúdo tenha um forte componente de finanças pessoais, ou seja, de capacitação dos jovens para que eles lidem melhor com dinheiro na prática. Já entre educadores, a expectativa é um pouco diferente. “A ideia ao longo do debate era incluir ‘educação fiscal’, tratar de como e por que o Estado arrecada impostos e que serviços públicos ele tem de prestar”, afirma Daniel Cara. Em uma apresentação feita em Brasília, o educador financeiro Álvaro Modernell listou, entre os tópicos a incluir na educação financeira, outro pontos ainda mais amplos – a ética nos relacionamentos, a rejeição à corrupção, a consciência ambiental e a responsabilidade social, todos extremamente relevantes, mas não necessariamente relacionados à saúde financeira do dia a dia.

Há os que propõem uma visão conciliadora, como Luiz Calado, autor de livros de educação financeira, que participou dos debates nos últimos dois anos como representante da antiga Anbid (entidade que representava os bancos de investimento). “Educação financeira não é só número. É entender comportamentos, expectativas de vida, a dinâmica da sociedade”, afirma. “E os professores podem usar a parte de matemática financeira para dar mais sentido prático às aulas de matemática”.

O debate deverá avançar ao longo de 2011, com o projeto-piloto em andamento em cerca de 440 escolas de São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Minas Gerais, Ceará e Tocantins (outras 440 escolas que não terão educação financeira serão usadas como referência para os resultados obtidos). A formulação de políticas de educação financeira para toda a população vem sendo fortemente incentivada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, entidade que reúne os países mais ricos do mundo). Nações como Estados Unidos, Reino Unido, Austrália, França, Japão e Espanha definiram suas estratégias, mas a obrigatoriedade do ensino nas escolas não é uma tendência global. A Holanda preferiu, até o momento, deixar as escolas livres para abordar o tema como quiserem. Sander Verban, consultor sênior do Ministério das Finanças holandês, explicou o motivo numa passagem pelo Brasil, no fim de 2009: no momento, eles preferem se concentrar em melhorar o ensino de matemática e língua. Eis uma mensagem valiosa.

Marcos Coronato - Revista Época

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